quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Café Josué

Em Blumenau
Tem um cafezal
O dono era baiano
E por ironia da vida
Ele morava perto da rua Bahia

Quem o visitava
Ele presenteava
O regalo era café moído
Cheiro bom de rústico

Eu o conheci pouco
E o pouco que conheci
Eu vi
Sua arte de sorrir

Sua pele era cor de café
Seu sorriso era cor de xícara
Branco de alegria
Cor viva de vida

Lembro dele na porta do salão
Esperando pra apertar a minha mão
Apesar de suas dores
O aperto de mão era forte
Forte igual café forte
Torrado e moído na hora
... mas ele foi embora
A doença o derrubou
Mas ele caiu de pé
E uma dia ele vai se levantar:
“Levanta”
A Voz vai ordenar
O baiano vai responder, eu sei:
“Estou indo, meu Rei”

Um dia
Ainda
Ele vai me chamar no portão:
“Vem beber café socado no pilão
Já tá esquentando no fogão”

Café com Josué
Josué cor de café

Essa é a história de fé
E dos pés de café
Do meu irmão Josué
Dezembro 2017

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Sua pele era cor de café
Seu sorriso era cor de xícara

Cigarra a cantar

0:00
Ninguém vai lá fora
Perguntar pra cigarra
Porque ela cantarola
Dizem que ela profetiza
Anunciando a chuva e sua justiça
Reclamam que não é cantoria
E nem melodia
Mas que é só gritaria

A gente olha pro nada
E vê um breu
A cor de fundo
É escuro profundo

1:30
Eu ouço e acho um canto triste
Na escuridão da noite
Os animais não reclamam
Ouvem e nada falam
Mesmo se falassem
Nada diriam
Quanto respeito
Pelo sofrer alheio

2:45
A madrugada passa
Enquanto a noite avança
E a cigarra não se cansa
Ela canta e ninguém dança
Ela não toca viola nem gaita
Não baila nem usa saia
Apenas fica só
E canta de fazer dó
Ou ré, ou mi, ou sol
Mas a noite é da Lua
E a rua fica toda sua
Pra cantar com ou sem luar
A cigarra não quer lutar
É só cantar
Como que riscando o ar
Igual quadro negro escolar

A mata emite mais sons
Grilos não se omitem
Sapos não finguem
Gatos não se decidem
E em cima do muro permanecem
Morcegos se escondem
Atrás de suas capas
E a cigarra alienada
Canta enquanto tudo passa
A floresta não é acústica
Mas a sua coreografia
É estática e rústica

4:00
A hora voa
E ela não fica rouca
E canta feito louca
Parece que vai estourar
De tanto cantar
De tanto esperar
Quem vai elogiar?
Não sei porque
Mas ela canta e não cobra cachê
Não seria muito
Só pra cobrir os custos

4:25
Quer uma dica
De quem lhe admira?
Chame um louva-a-Deus
Aprenda a orar
E resolva o que lhe incomodar

6:00
Amanheceu e ela vai se calar
Mas vai deixar no ar
Algo a lhe entregar:
Seu amor não veio lhe ver
Eu desconfiei disso
Que havia um motivo
Agora ela vai viver o dia
Pra cantar à noite
Sinto por você
Dona cigarra
Que se veste de gala
Não se irrite
Mas vou lhe confessar
Amiga minha
Mas a dona formiga
Se ri de sua angústia
Bom dia pra você
A gente se vê ao anoitecer
Dezembro 2017




segunda-feira, 22 de maio de 2017

Rotina de motorista

Depois de um longo inverno desempregado, surgiu a Uber e foi uma nova experiência profissional.
__________________________________

Arrumei um trabalho
Consegui uma atividade
Batalhei um serviço
Abençoado com um ganha-pão
Ganhando a vida
Levando gente pra baixo pra cima

Tudo o que eu vejo
É passageiro
Definitivo é só o dinheiro
Que diz que vem mas não veio

Ora asfalto
Ora rua de barro
Suportam o peso do meu carro
E vou rodando e dançando
Conforme a música tocando

Bato borracha
Pelo dia adentro
Pela noite afora
De dia digo boa noite
De noite digo bom dia
A gente pode se perder nos horários
Mas não pode errar os itinerários

Meu carro também sente
É gente igual a gente
É um cara de lata
É um pé de borracha
Mas apelo pela sua boa praça:
Não bata pra entrar
E saia sem bater

Tem lugar com cara de fim de mundo
Jeitão de submundo
Iluminado ou tudo escuro
Colorido ou sisudo
Morro, barranco
Enlameado ou alameda
Matagal e coisa e tal
E agora José?
Encaro e engato a primeira
Ou saio dali de segunda?
A razão diz num ouvido:
Não  vai e volta, pois é fria
Na outra orelha
A emoção cheia de razão:
Avisa que a conta chegou sem avisar
Que a luz secou
Que a água findou
Que a geladeira esquentou
Que a mamadeira esvaziou
A decisão é sua
É sua a indecisão
Eu sei o que fazer:                                
Depende da cor da minha conta
Depende da cor de minhas calças

Se perguntar onde tem
Gasolina aguada
Ducha barata
Café e etanol
Eita nóis!
Dou endereço de tudo
Conheço essa cidade
De cor e salteado
Com os olhos fechados
Com o GPS ligado

Por falar em histeria
O aplicativo me grita
E eu já vou indo
Muita coisa não se aplica
Mas se explica
Por isso sai da frente
Que atrás vem trânsito
Maio 2017

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