sexta-feira, 23 de maio de 2014

Caçando o caçador

Você é caça ou caçador?
Não importa, seja o que for,
É preciso começar a correr feito um corredor.

Eu já corri em Moema,
Nas Itoupavas e na Penha,
No Coripós e na Freguesia do Ó.
Comecei a correr na Paulista.
Ah, eu era um jovem,
Com fôlego de maratonista.
O ‘bicho’ já estava pegando,
E eu já estava correndo.
Corri em volta de Bancos,
E nem podia me sentar,
Senão tomava nos flancos.

Já corri nos Estados Unidos,
Por quatro anos seguidos.
Ousei parar por um tempo,
E fiquei parado por tempos...
Às vezes me sentia ao relento!
Na Alemanha foram duas corridas,
Mas duraram poucos dias.

Às vezes me sentia um caçador,
Mas era um engano,
Eu estava na mira dum predador.
Por vezes achava que era presa,
E fugia com pressa,
No meio de selvas de pedra.
Quando estava cansado à deriva,
Quase desistindo da vida,
Recebia um prêmio,
Como uma presa abatida.

E as energias me voltavam,
Pra continuar a correr como um corredor...
Pois eu nunca sabia,
Se eu era caça ou caçador.
                                                                             Maio 2014


sexta-feira, 16 de maio de 2014

La pizza

A dona redonda,
Fica toda, toda.
Cheia de borda,
Recheada e gostosa.
Toda enfeitada e azeitada,
Se sentindo a bela dona com azeitonas.
Com mil calabresas da Calábria,
Mozzarella toda amarela,
E tomates avermelhados e envergonhados.
Massa fina ou massa grossa?
Que me importa,
Se já me entupiu a aorta?
Sem conselhos da nona,
Per favore!
Ma què, agora quero um tinto,
Pra deixar o sangue mais fino!

Que saudade di Napoli,
Da bota da Europa.
Aqui em Brasília,
Tudo acaba in pizza.
É um povo que aprecia,
O sapore di Itália querida.

O pizzaiolo mete a mão na massa.
Ele e a massa se amassam,
E a massa passa e fica só,
Naquele calor de muito suor.
Ela quase passa mal,
No forno de não-sei-quantos-graus.
Depois da noitada de fornada,
Ela vira uma massa toda assada.
Mas depois tudo passa,
E ele se amasia,
A suar e se amassar com outra massa,
Tão redonda quanto à outra.
Pizzaiolo é homem de uma massa,
E muitas pizzas.

Este é o milagre à moda di Itália.
A farinha que vira pizza,
Na terra di Brasile.
Mama mia,
Que terra querida!
                                       Maio 2014

"Ela quase passa mal,
No forno de não-sei-quantos-graus."





segunda-feira, 12 de maio de 2014

Minha honra, por favor!

Meu cartão saiu da chapeira.
Agora o crachá é pra enfeitar,
Meu presente ultrapassado,
Ou pra enfeiar,
Meu passado recente.

Embora eu não quisesse,
Quiseram que eu fosse embora.
Fui mandado embora.
Estou sem trabalho,
Agora só dou trabalho.
Antes mil e uma utilidades,
Agora futilidades mil.
Minha carteira de trabalho,
Está ociosa e ansiosa por trabalho.

Nem parece que tenho cidadania,
Pareço aposentado sem aposentadoria;
Relógio sem ponteiros;
Porteiro sem portaria;
Porteira sem menino;
Menino sem pião;
Peão sem obra;
Obra-prima sem pintor;
Pintor sem tinta;
Tinta sem palhaço;
Palhaço sem circo e sem risos.
Respeitável público,
Esse é meu circo sem sorrisos!

Muito prazer,
O prazer é todo meu.
Esse é meu currículo,
O currículo é todo seu.
Sou honesto e trabalhador,
Sim senhor.
Só preciso de um trabalho,
Meu senhor.
                                        Maio 2014

Crachá pra enfeitar ou enfeiar...

sexta-feira, 9 de maio de 2014

Suco grátis

A alma chora e sai um caldo.
Suco grosso e viscoso,
Gosto insosso.
A gente vira um fruto,
Se espreme tanto até sair o suco.
Depois a gente parece bagaço bruto.
Se sente destruído, espremido e encolhido,
Recolhido e escondido.

Os olhos é que servem o suco,
Sem copo, sem gelo, sem canudo.
Suco da alma tem sabor amargo,
Não adoça nem com açúcar mascavo.
Haja lenço para secar,
O que não pode ser seco.
Mais fácil é secar gelo!

Mas a gente é guerreiro,
Cai e levanta o ano inteiro.
A gente não fica amargurado,
Pelo suco escorrido e derramado.
Do bagaço ressurge a laranja,
Da garapa moída, novamente o verde da cana.

Que venham nossos inimigos,
Que venham novos desafios.
A gente vai se sentir oprimido,
Comprimido e espremido,
Deprimido e quase desistindo,
Mas nunca vencido.

Mesmo secando olhos encharcados,
A gente continua em passos largos.
Talvez tímidos ou decididos,
Mas de astral pra cima,
Pra suportar tantas esquinas.

Cada gota de suco da alma,
Fica guardada e armazenada,
Rotulada e engarrafada,
Numa prateleira no céu.

Está cuidada pelo Criador do mundo,
Pelo Dono de tudo.
                                          Maio 2014

Os olhos é que servem o suco,
Sem copo, sem gelo, sem canudo.

terça-feira, 6 de maio de 2014

Ser enquanto crescer

Quando crescer,
O que você quer ser?

A criança esperança diz:
Quero ser médico de nariz,
Talvez ator ou atriz,
Ou palhaço pra fazer rir!
Deus me livre de ser faquir!
Um piloto de rallye,
Aí sim!

A criança viaja ao responder,
Quer ser tudo quando crescer.
Mas depois volta a se entreter,
Com bola, boneca ou brincar de esconder.

Um adolescente diria:
Ser estudante de medicina,
Ter uma banda e ser guitarrista,
Ou ser famoso como um futebolista.
Mas ele olha no espelho a sua fisionomia,
E se preocupa com sua espinha.

Um adulto saberia dizer:
Ser um trabalhador pra poder viver,
Ser assalariado pra pagar a conta que vai vencer,
Ser um bom pai para o filho que vai nascer.
Então ele acorda e desliga a TV,
Vai dormir e esperar o sono até o amanhecer.

Um idoso diria com serenidade:
Queria ser um velho com dignidade,
Talvez ser lembrado para a posteridade.
Mas principalmente e urgentemente,
Ser cuidado pelos meus entes,
E não ser tratado com um demente.

O desafio que temos é respondermos,
Que devemos ser nós mesmos.
Se encanador ou agricultor,
Se taxista ou diarista,
Se astronauta ou internauta.
Até um humilhado desempregado,
Debruçado sobre os classificados.
Às vezes até somos lunáticos,
Mas sempre terráqueos.

Por fora a gente é assim,
Por dentro a gente cresce até o fim.
Então eu vou responder:
Quando eu crescer,
Independente se eu vou vencer,
Eu quero ser eu!
                                        Maio 2014