quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Dando de ombros

O cérebro é um cara cabeça,
Mas tem nariz empinado.
E deve pensar com certeza,
Lá com seus neurônios,
Que é o mais importante.
O coração bate fundo,
Desde dentro da mãe,
E bate, bate na tecla,
Que é o mais importante.
As mãos não param,
E metem a mão na massa ou na graxa.
Os pés é que se racham,
E andam pra lá e pra cá.
Mãos e pés,
Andam de mãos dadas,
Andam juntos e pensam:
‘Nós somos os mais importantes’.

Quando tudo vai bem,
Tudo é uma beleza.
Quando tudo vai mal,
O cérebro perde a cabeça,
E tudo fica de ponta cabeça.
O coração bate descompassado,
E quase sai pela boca.
Os pés perdem o passo,
Trançam as pernas,
E metem os pés pelas mãos.
As mãos,
Arrancam os cabelos da cabeça.

Abalado ou inabalável,
Quem carrega o mais pesado,
São os ombros.
Dois caras que parecem um.
Musculosos ou não,
Que importa?
Mesmo quando dão de ombros,
Continuam a carregar,
O fardo de uns e outros.
Ombros suportam o peso da cabeça.
As mãos se agarram neles,
Em desespero.
Ombros têm ouvidos,
E ouvem o clamor do coração.

Os ombros,
Nunca ficam de mãos abanando,
E assumem outro papel também.
Para o consolo se oferecem.
E saem molhados,
Com lágrimas dos outros.
Pouco lembrados,
Não se sentem os tais,
Mas compreendem os ais.

Os ombros se doam,
Quando tudo e todos desmoronam.
Os mais importantes, então,
São aqueles que se dão.
                                      Setembro 2011


quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Seu Zé

Ao meu pai, falecido em 2008. Passou o tempo e hoje sei, somente hoje nos dias atuais, de seus problemas depressivos.
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Você não foi meu herói.
Não me entendia quando eu era boy.
Também não foi meu companheiro.
Não me apoiou quando eu era motoqueiro.
Lição de casa eu fazia sozinho.
Nem sabia se eu tirava dez ou cinco.
A compra ficou esquecida,
Da minha bicicleta prometida.
Eu e os outros,
Que éramos dos seus,
Não te compreendia.
O tempo passa.
O tempo mostra,
A seu tempo.
O tempo tem tempo,
E é paciente.
O tempo me envelheceu,
E me mostrou,
E me fez entender.
Depois de muito tempo,
Hoje eu sei,
O que se passava com o senhor,
Meu senhor.
Hoje a sua poltrona é vazia,
E sem você,
Também me sinto igual a ela.
Mas tenho ciúme dela.
Em seus últimos dias,
Suas pernas se rebelaram,
E pararam diante do tempo.
E foi a poltrona que te acolheu.
Fez o que era dever meu.
O senhor era um caipira.
Era o ‘seu Zé’ por aí.
Na família era o Zé Naves.
Ouvia Tonico e Tinoco.
Bebia café de coador,
Igual matuto da roça.
Comia de colher,
E fazia barulho tomando sopa.
São Paulo não combinava contigo.
Mas foi essa terra,
Que recebeu seu pó,
Num lugar que não era popular,
Mas era como um jardim.
Hoje compreendo,
O peso de sua cabeça,
E seus ombros.
Seus nervos, seus choros...
Quanta pressão!
A compreensão é forte,
Mais do que a morte.

Aí vai um pedido de perdão,
Meio tardio e vazio.
A poltrona me entende.
Quem dera um dia,
Quando seu pó subir,
Se pudesses ler e ouvir,
Essas letras já secas.
Quem dera te conhecer,
Diferente de outrora,
Olhar em seus olhos,
Como nunca antes e dizer:
‘Como vai, meu pai!’
                           Setembro 2011

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Nariz vermelho

Difícil trabalho,
Do palhaço.
Palhaço faz graça,
Pra vida ter graça.
Pra gente esquecer desgraças,
Até ele cair nas nossas graças.
Por uns trocados,
Ele se troca,
Vira palhaço e faz graça.
Isso é impagável!
A gente sorri, gargalha e ri,
E esquece de ser triste.
Deixa tristeza lá fora,
Pra rir lá dentro,
No teatro ou no picadeiro.
Mas nosso riso,
Tem de vir lá de dentro,
Até os dentes aparecerem,
Mesmo sem dentes.
Tem gente que ri,
Até perder a dentadura.
Palhaço é uma ajuda,
Pra esquecer a amargura,
A vida dura,
E as agruras.
Palhaço é herói.
Vence a nossa tristeza,
Coisas que pra gente dói.
É uma dureza!
Palhaço faz a gente chorar.
Palhaço faz a gente ter dor.
Palhaço faz a gente passar mal,
De tanto rir.
Palhaço faz a gente pensar,
Que vai morrer,
De tanto rir.
Quem gostaria de morrer rindo?
Nem morto!
A gente deixa tristeza pra lá,
Pra rir.
Palhaço deixa tristeza pra lá,
Pra fazer a gente rir.
Coisa difícil,
Neste mundo difícil.
Tem dia que o palhaço,
Nem precisa de maquiagem.
Mas tem dia,
Que ele reboca toda a cara.
Na verdade,
Todos somos palhaços.
Sempre precisamos,
Rebocar a cara,
Pra encarar uns e outros.
Rebocar a cara pra rir,
Mesmo quando não se quer.
E muitos riem da nossa cara.
E rimos da cara dos outros.
E a palhaçada continua.
Isso tira a alegria!

Final do show,
De cada show,
Palhaço tira maquiagem,
Pra encarar a vida,
De cara limpa,
Com a cara e a coragem.
Inicio de show,
De cada dia,
A gente usa a maquiagem,
Pra encarar a vida,
De cara limpa,
Com a cara e a coragem...
Pra rir ou pra chorar...
O show não pode parar...
Cadê meu nariz vermelho?

                                           Setembro 2011