sexta-feira, 28 de março de 2014

Geração Vila Praia

Estudei da 1ª até a 8ª série na Escola Municipal de Vila Praia, zona leste de São Paulo. Os anos passaram, mas a saudade fica daqueles anos sem muitas responsabilidades, mas com a ajuda de professores e colegas, todos colaboraram para a parte boa da pessoa que sou hoje. Obrigado professores, obrigado colegas, obrigado meu Deus.
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Camisa branca,
Branco igual àquela geração.
Branco de mistura,
De puro com ingênuo.
Branco sabor chiclete,
Que grudava no cabelo e na calça da gente.
Branco criança,
De bolinha de gude,
E menina de trança.
Branco da cor do barro,
De campinho de terra.
Branco da cor de caderno,
Que com o tempo,
Toma forma de juízo,
Caráter e atitude.
Branco da cor de amarelinha,
Rabiscada num asfalto preto,
Na vila vizinha perto da minha.

No pé, sapato preto,
Ou kichute com chulé.
Às vezes o chinelo era usado,
Mas virava sapato.

O uniforme tinha azul;
Não era azul brasileirinho,
Mas era azul marinho.
Calça comprida de moleque,
E saia rodada de menina.
Era azul mas não era anil,
Era mais forte do que o azul do Brasil,...
Aliás, era época que nem parecia Brasil.
Azul criança esperança;
Mas era criança que corria e construía,
A sua própria esperança.
Azul forte, cor gritante,
Da tonalidade e vigor de estudante.

Geração azul e branco,
De São Paulo suburbano.
Na camisa tinha um brasão,
O bolso a mãe costurava,
E ficava em cima do nosso coração.

Essa era geração Vila Praia;
Que cresceu e virou adulto;
Mas quando criança viveu igual criança.
                                                   Março 2014




segunda-feira, 24 de março de 2014

Não contem glúten

A mamãe diz que em seu ventre,
Contém um projeto de gente.

Uma casa com bola e boneca,
Diz que ali contem criança sapeca.

O jornal da noite diz que não contém,
Nada de nada pra entreter.

Gente bonita na TV,
É certeza que contém músculos,
E minúsculos conteúdos,
Em cérebros de moluscos.

Nos estádios reformados,
Com orçamentos deformados,
Contém um povo alucinado,
E outro elitizado.

Enquanto não acaba o campeonato,
A prefeitura diz que sim,
A poeira se contém, mas grita não bem alto,
E a nossa rua continua sem conter asfalto.

Uns tantos dizem sim,
Uns fulanos dizem não,
E eu fico nesse furacão,
Procurando meu rumo e meu cão,
Contentando-me em me conter,
Em manter meus pés no chão.

Contido ou não contido?
Contém ou não contém?
Nessa sociedade insaciável,
Contenho-me em viver com todos,
E não prejudicar ninguém.

O melhor que posso fazer,
É ir ao mercado ou armazém,
E procurar se tem,
Algo que não contém glúten,
Para alguém que eu quero bem.
                                             Março 2014



terça-feira, 18 de março de 2014

Jornal da noite

Deu no jornal da noite,
Aquele que fala ‘boa noite’,
E naquele outro também,
Aquele que fala ‘tudo bem?’.
Muitas pessoas na delegacia,
Todos enrolados com a polícia,
Algemados e trancafiados,
Traficantes ou usuários,
Estupradores ou aliciantes,
Meliantes ou assaltantes.
Todos são animados e unânimes,
E se dizem inocentes e injustiçados.

O crime tenta ser justo,
Tem olhos tapados e aceita engravatados,
Pé rapados ou escolarizados.
O crime tem seu conceito,
De não ter preconceito,
Todos são bem aceitos.

Tá na moda e é atual,
Aparecer na TV e no jornal,
Mas só se roubar mais de um milhão,
Senão vai ficar na prisão.
Se usar terno,
Fica em regime semiaberto.
Pode sair e até trabalhar,
Dar uma saída e fazer trotuá,
Beber vinho e comer caviar,
Voltar pra cela individual,
E cumprir sua penosa pena.

Tem ladrão que tem vergonha,
Tapa a cara com camisa ou fronha.
Outros se sentem mártires,
Vão em cana fazendo V da vitória.
Querem ir pro livro de história.
Socam o ar com punho fechado,
Parecem o Pelé no gol mil marcado.
Peitos estufados seguem destemidos,
Detidos em seus cárceres suspeitos.

Tudo é suspeito neste berço esplêndido.
Posso até ser suspeito,
De suspeitar desses sujeitos.
É tanta sujeira que a gente suspeita.
Parecem super-heróis,
Que nenhuma jaula os detém,
E nenhum mortal os destrói.
Mas se alguma kriptonita,
Lhe der dor de barriga ou disenteria,
É só ir à uma clínica de gente grã-fina,
Fazer exame e tomografia,
Ressonância e endoscopia.
O resultado sai no mesmo dia!
E depois pleitear uma pena domiciliar,
E cumprir às ‘duras penas’,
O restante da sentença.
Que pena que dá!

Eu digo e todos repetem comigo:
Quem é honesto,
Não rouba botão nem um milhão,
E é livre pra ir e vir.
Dá pra ver daqui da sala,
Pelas grades de minha casa.
                                        Março 2014



terça-feira, 11 de março de 2014

Tomara que cai

Outra conta vai vencer,
E eu vou perder.
Eu não sei o que fazer
Não dá pra fazer de conta,
Deixar pra lá e esquecer.
No fim das contas,
A conta sobra pra mim.

Cadê meu amigo banqueiro?
Apesar de alguns negativos,
Ele sempre me levou em conta.

Tenho um nome a zelar.
Minha honra, minha reputação,
Quanta coisa pra cuidar!
Se eu descuidar,
O esforço de anos,
Entra pelo cano.

Só não dá pra falhar.
Um erro anula muitos acertos,
A cobrança vem a galope,
E muitos dedos em sua direção.
Nome e reputação,
Ficam na corda bamba,
Sem sombrinha naquele fio de linha,
Na dança da balança,
Com tomara que cai.
 A piscina ou baldinho de lama,
 Lá embaixo fica torcendo,
 Por você e pra você,
 Cair e se enlamear igual glacê.

O ventilador tá lá no quarto.
Ele recebe o pagamento,
E trabalha cheio de energia,
De noite ou de dia.
Quanta inveja do meu ventilador.
                                               Março 2014


segunda-feira, 3 de março de 2014

Acontece quando anoitece

O silêncio chegou com a noite,
E o escuro pintou o ar.
O ventilador faz não,
E espalha o calor,
Pelos quatro cantos do quarto.
É engraçado ver os pernilongos,
Voando meio tontos,
Todos sem plano de voo.

O cão do vizinho está inquieto,
E avisa que seu turno é agitado.
Ele se estressa com as entregas,
Encomendas noturnas que intriga.
O vigia apita,
E avisa pra quem precisa:
Ele está aqui e não na vila vizinha.

A minha insônia não tardou,
Chegou e se deitou.
Ela não dorme no ponto!
Meus sonhos ficaram para outra noite,
Meus pesadelos são pra hoje.

No quarto ao lado,
Meu filho espanta sono e pernilongos.
Suas armas são de cordas,
Nylon, metais e vocais:
Uma gaita e cantorias,
Um violão e muitos gritos.
Ai de meus ouvidos.
Sinto muito pelos vizinhos...
Ou vice-versos!

Lá no alto, embaixo do telhado,
A caixa d’água mata a sede,
A água sai pelo cano,
E a caixa fica toda cheia.

O rádio relógio cura sua crise,
Agora ele é só relógio.
Já estava na hora!
Seus números me olham assim,
Com olhares desse tamanho!
Ainda está tarde ou já está cedo?

Conto meus carneiros,
Mas perco a conta.
Conto, reconto,
E conto com eles,
Mas o galo canta e eles se dispersam.
Eu continuo desperto,
E me desespero.

Ouço um espetáculo vindo da avenida.
Borrachas fritando e pneus gritando,
Plásticos e metais num atrito louco.
Mais um show de mau gosto!

Meu sono deveria ser um prazer,
Mas seu atraso é meu tormento.
Se ele não vier,
Sei lá o que será de mim amanhã...
Amanhã que já é hoje!
                                           Março 2014