quarta-feira, 20 de março de 2013

Nada a declarar

Não tenho renda,
Nem financeira,
Nem de mulher rendeira,
Nem de costureira.
Mas sou cidadão de bem, sim senhor,
E declaro pra quem for,
O que deveria ser só da minha conta.
Aliás,ô conta toda vermelhona!
Igual a mim, cheia de vergonha.

O leão fica descabelado,
Com a boca cheia de dentes, assim ó!
Querendo comer,
Até a fivela do cinto da gente;
Cinto tão apertado,
Que tá marcando a minha costela,
Onde antes havia barriga,
E tá apertando a bexiga,
E me deixando doente.

E escreve aí que eu declaro,
Que tenho tantos dependentes,
Que acho que tô ficando demente,
E tenho certeza que não é parente.
É gente de a pé,
Gente de carrão blindado e importado,
Até gente de Brasília.
É gente de iate,
Enquanto eu fico boaindo,
Igual garrafa pet,
No Tietê em dia quente.
Escreve aí,
Que é tudo meu dependente.
E esse povo,
Nem sabe se sou gente,
Ou sou indigente.

Não quero cair na malha fina,
Mas pra pegar tubarão aí de cima,
Eu sei como e eu dou uma dica:
Tem que ser rede da grossa,
Meter arpão no focinho,
E algemar as barbatanas.
Êita povo vivo!
Mas fede tudo a peixe morto!
É mais fácil limpar sardinha,
Do que essa gente de gravatinha. 

Mas eis que declaro meus bens.
Correção: declaro meu bem,
Ano/modelo sei lá de quando.
Tenho uma despensa,
Que dispensa comentários.
Ela parece pneu vazio,
Não me leva a lugar nenhum.
Eu abro aquela porta,
E olho lá pra dentro,
E ela olha pra mim.
Ela nada faz por mim,
E deixo ela pra lá.

Se o tal leão com cabelo de laquê,
Fosse meu hóspede uma semana,
Ele voltaria para a savana,
Com manequim de louva-a-deus,
De juba despenteada,
Orando a Deus pelo povo judiado,
Pedindo perdão pelos seus pecados.

E assim sem mais, sem menos,
Assino e carimbo,
Rubrico e finalizo,
Minha declaração de I.R.A.:
Imposto de Renda de Assalariado Angustiado.
Se alguns primeiros,
Segundos ou terceiros,
Se injuriarem pelo acima escrevinhado,
Abram os trombones de seus ouvidos,
E ponham-se a ouvir e escutar:
NADA A DECLARAR!
                                                              Março 2013




segunda-feira, 18 de março de 2013

O show que veio de cima

Eles enviaram aquele regalo,
E foram embora para o abraço.
Homens valentes,
E honraram suas patentes.
Foram heróis do caos,...

Eles abriram a porta,
E aquilo caiu.
O vôo durou a eternidade,
E em minutos ela chegou.
Mas foi um bailar sensual,
E fatal.
Parecia câmera lenta,
O vôo daquela pena.
Nuvens tentaram segurá-la,
Mas ela era obstinada,
E nada iria barrá-la.
Aquela senhora do ar,
Pediu licença para dançar.
Os pássaros saíram de cena,
E foram poupar suas penas.
De salto alto ela tocou o solo;
Depois da dança ela iria soltar seu coro,
E sua voz grave e aguda,
Iria ecoar às alturas,
Iria ressoar em lonjuras.
E todos ouvimos!

Foi uma apresentação de gala,
O show daquela dama que veio do céu.
E ela desceu e cresceu.
Ela era alta e esguia,
Mas tinha raiva e estava enfurecida.
Ela bateu o pé uma vez,
Foi um pisar único,
Naquele palco rústico.
Era horrível o som acústico,
Irritaria qualquer músico.
A poeira subiu,
Os olhos arderam,
E a platéia não gostou.
Mas não deu tempo,
E o tempo parou praquele show.
E tudo parou para nunca mais.
E ninguém mais viu,
Ninguém mais ouviu,
 Ninguém mais sentiu,
 Nem amor nem ódio.
E todos fecharam os olhos,
Para seus sonhos e abrolhos.
Eles morreram e ela ainda vive.
Todo seu aniversário,
Jornais e revistas a revivem.

Esta é a história desta artista;
Cheia de pompa, ela veio de cima,
Para aquele show...
O show em Hiroshima. 
                                                      Março 2013




sexta-feira, 15 de março de 2013

Balançando a semana

Li notícias de um tal de conclave,
O fumacê vai subir e incomodar as aves.

Vi meu time mandando as bolas na trave,
Outro jogo que deu empate.

Um artista se foi e vai virar celebridade;
É mais um que morre na obscuridade.

Muitos ‘Kikos’ deram tchau a um certo Chávez,
Uns vão aplaudir, outros sentirão saudades.

Volta às aulas das faculdades;
Pobres calouros, vão passar por ridicularidades.

Uns falam do fim da humanidade,
E aguardam a próxima data da calamidade.
  Hollywood vai faturar mais alguns dólares.

Uma moça leiloa a virgindade;
Alguém pagou por exclusividade,
Mas quem garante o produto e sua originalidade?
Será que alí tem alguma qualidade?

Meu filho ouve essas reportagens, 
E quer saber a verdade.
Se o tal conclave e a noticia do padre,
É o mesmo caso do menino da cidade,
Que não brinca mais com outros de sua idade.

Meu filho com espírito de esportividade,
Pergunta se o nosso time joga com seriedade.

Meu filho com ar de serenidade,
Pergunta se a morte daquela personalidade,
Foi por drogas ou foi alguma enfermidade.

Meu filho em sua infantilidade,
Fica confuso com a morte do Chávez.
O que ele vai assistir agora às tardes?

Meu filho falando de escolaridade,
Acha que esse tal de trote é pura maldade,
E diz que deveriam cultivar a amizade.

Meu filho analisa o futuro da humanidade,
E diz que quando crescer vai viver com simplicidade,
Vai tratar todos com dignidade,
E que vai viver até a eternidade.

Meu filho em sua ingenuidade,
Me pergunta se essa tal virgindade,
Também está a venda na lojinha da comunidade.

Eu vejo sua sinceridade,
E digo a ele esquecer essas bobagens.
Quero usar de sensibilidade,
E poupá-lo de mais futilidades.
Ele sorri com jovialidade, 
Vai brincar e aproveitar sua mocidade.
                                                       Março 2013





terça-feira, 5 de março de 2013

Vagueantes

Tem mente que vagueia.
 São cabeças que vagam o mundo.
Vão em vagão,
De avião na contramão,
Ou na boléia de caminhão.
Voam com vaga-lumes,
Voltam com clarão,
Ou com a escuridão.
São uns divagadores,
Neste mundo a vagar.

São mentes,
Que plantam sementes,
Pra gente,
Viajar em páginas quentes,
Cidades circenses,
Desertos e florestas interessantes,
Em lugares distantes,
Em dimensões inexistentes,
Em Arco-Íris no poente,
E aquarelas do oriente.
E a gente se sente,
Um verdadeiro co-regente,
Numa orquestra sem regente,
Com notas sol maior,
Em luar incandescente.

E tem gente,
Que dizem absurdos:
São vagabundos.
Pensamentos lunáticos,
E terráqueos.
Tem gente,
Que pensa que pensa!
Pensando bem,
Eles só pensam,
E não sabem voar,
Nem vaguear.
 Por isso apenas pensam...

Mas os vagueantes,
Que andam sobre as vagas,
Que devaneiam e veraneiam,
Apenas ouvem,
Aqueles que não vagueiam...

...e pegam a pena,
E continuam a discorrer,
Seus devaneios vagueantes,
E transformam páginas brancas,
Em folhas ricas de conteúdo;
 Mas não tão rica,
 Como uma folha verde,
 De uma grande floresta tropical,
 Ou de um pequeno trevo,
 Que nasce no quintal...
  Mas isso já é outra viagem...
                                                       Março 2013





sexta-feira, 1 de março de 2013

Rodovia travada

Garganta é igual cadeado,
Às vezes ela tranca e nada passa,
Nem desce, nem sobe,
Nem vai, nem fica,
E tudo fica ruim,
Neste vai-não-vai,
Neste vem-não-vem.

Basta um olhar,
Que o cadeado fecha,
E as comportas dos olhos,
Se abrem e as lágrimas,
Brotam e descem,
Como um aguaceiro de verão.

Basta uma palavra,
Ou uma música guardada,
Que tudo trava,
E não se ouve mais nada.

Basta uma recordação,
Mais antiga que uma lembrança,
Mais recente que um suspiro,
Que a tranca funciona,
E o 'filme' novo ou antigo,
Preto e branco ou colorido,
Vem à tona igual um estampido.

Basta uma imagem,
Que te leva pra uma viagem,
Do tempo do branco e preto,
Da época do vinil,
Que te trazem imagens mil,
E a tua garganta vira um funil.
Vontade de fugir,
E mandar tudo,
Pra qualquer lugar,
Que ninguém nunca viu!

Ah, pobre do coração!
É o zelador de tudo isso.
Como ajeitar isso tudo?
Coração e cérebro,
Tem de descobrir,
O segredo pra destravar,
A rodovia da garganta.
Isso causa quilômetros,
De congestionamentos,
De engarrafamentos,
Em todos os membros.
E o corpo sofre...

Haja xaropes e gargarejos,
Pra acalmar a sofrida garganta.
Quando tudo acalma,
Até aquelas irritadinhas,
E vermelhinhas amídalas,
Se acalmam e soltam a voz,
Pra chorar ou pra falar.

Aí as vias se liberam,
E se libertam...
E a garganta passa bem.
                                                        Março 2013