segunda-feira, 28 de abril de 2014

Mineirano

Sou filho de mãe e pai mineiros
De ambos os lados, de todo jeito
Mineiro de peito cheio
Sou mineiro até o osso do pescoço
Me levaram para Sampa no forno
Produto interno caseiro
Parecia pão de queijo mineiro
64 era ano de quadros ultrapassados
E futuros atrasados
Para um país mal passado

Viajei chacoalhando
Mãe e filho se enjoando
Chegamos em Guarulhos
Com expectativas de outro mundo
Mas mal começavam os apuros
Nasci em casa com parteira
Meu berço era uma caixa de madeira
Casa de tábua era rústica
Onde começou andar aquele caçula
Que futuro me aguardava
Enquanto eu era guardado
Num engradado amadeirado?

O lugar era alugado
Chão de terra batido
Mas tudo arrumado e limpo
Ali mal acomodava
Aquela família de cinco
Que procurava seu mundo
Naquele fim de mundo

Que sorte ter nascido pobre
Onde pai e mãe
Não conheciam nem outro nem cobre
Que sorte nascer em família
Que só conhecia enxada e arado
E o suor era cor de barro

Então eu chego a uma conclusão:
 Eu sou um mineirano
 Sou mistura de mineiro e paulistano
Puro só o amor pela origem
                                            Abril 2014


Nasci em casa com parteira
Meu berço era uma caixa de madeira

terça-feira, 22 de abril de 2014

Forasteiro terráqueo

Sou forasteiro aqui onde vivo.
Vivo aqui,
Como se eu não fosse daqui.
É estranho ver tudo assim;
Não compreendo e não concordo,
E me sinto um estranho.
Por onde vivo, por onde ando,
Tenho que ter dinheiro,
Senão não existo.
Tenho que matar pra viver,
Tenho que viver pra matar,
Ou não entendem como vivo.

Mundo corporativo é um mundo à parte,
Com vida própria,
E próprio idioma.
Quem lá vive,
Produz para a carreira,
A vida inteira,
E morre na aposentadoria.

Sento pra ver TV,
E escolhem o que devo ver.
É programado e enlatado,
É tudo preparado e pré-pronto.
É o horário nobre,
Pra assalariados e desempregados.
Eu como minha janta,
Digo boa noite por hoje,
E vou dormir pra amanhã.
Hoje a coisa tá preta,
E amanhã é dia de branco.

Vivo sobrevivendo 30 dias por vez;
É o tempo que tenho todo mês,
Pra receber e pra pagar.
Não exatamente nem necessariamente,
Nessa ordem e progresso.

Mal ou bem pense bem:
Ainda bem que temos o futebol.
A gente comemos marmita com farinha,
Mas a bola é nossa alegria.
Obrigado governos e cartolas,
Por tantas boladas.

E a gente ri e chora,
E vamos pra galera.
Nosso nome não aparece na galeria,
Mas o mais importante,
É não ter vergonha de ser ficha limpa,
Enquanto sobrevivemos,
Como forasteiro num mundo,
Cheio de coisas vazias.

Pessoas nascem iguais,
E são tratadas diferentes.
Lhes marcam as testas como indigentes,
Se o sangue não for azul,
Se forem do hemisfério sul.
Se forem afros e pobres,
Serão pessoas sem sorte,
E lutarão contra os poderes do norte.

Apesar de tudo e de todos,
Encaro meus monstros,
Escancaro meus dentes,
E sorrio como se eu fosse,
Um perfeito forasteiro estrangeiro,
Num mundo estranho,
Onde nasci e cresci,
Onde mais sobrevivo do que vivo.
                                                     Abril 2014

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Bom dia, cavalo!

Eu não quero fechar os olhos,
E passar a noite no escuro.
Preciso de meus olhos,
Pra olhar e contemplar,
A Lua e suas companheiras.

Eu não quero,
Ser mais um, não senhor,
A não saber dizer não.
Meu sim é precioso,
Mas meu não precisa ser usado,
Da melhor forma, sim!

Eu não quero,
Sair pelas ruas todo esperto,
Dizendo que isso ta certo,
E aquilo ta incorreto.
Eu tenho muita roupa suja,
E meu teto não agüenta uma agulha.

Eu não posso,
Por a mão no peito e cantar o hino,
Até chorar igual menino,
E enquanto isso,
Rotular meus patrícios,
Como nordestinos ou nortistas,
Como paraíbas ou sulistas;
E querer enxotá-los,
Num pau-de-arara pela estrada,
De volta para suas terras,
Como se eu fosse,
Dono do mundo e de tudo.

Eu não posso,
Olhar para o céu satisfeito,
E me orgulhar do homem e seus feitos,
Curtir outro foguete indo pelos ares,
Voando lá longe em Marte,
Ou aqui pertinho na Lua,
Enquanto todo dia na comunidade,
Lançam um novo barraco na rua.

Eu não posso,
Apoiar outra distribuição de preservativos,
Para uma massa de gente poder curtir,
Sem medo e sem vergonha,
Outra festa popular de arromba.
O que precisamos preservar,
É o moral da minha,
Da sua e da nossa família.

Eu não posso beber,
Até perder os sentidos.
Isso não faz sentido!
Preciso de meus sentidos,
Pra viver de forma que faça sentido.

Como gritar palavras de ordem,
Exigindo ‘limpeza’ dentro do governo,
Se por alí e por aqui,
Minhas garrafas pet bóiam por aí.
Se meus papéis de bala,
São engolidos pelos bueiros,
Até eles vomitarem insatisfeitos.
Se minhas bitucas de cigarro,
Se arremessam de meus dedos,
E voam iguais passarinhos com medo,
Quando fogem de um passarinheiro.

Precisamos viver de forma ordeira,
Antes de pedir e exigir,
Ordem e progresso,
A prefeitos e asseclas,
A governos e congressos.
Senão nem precisa se aborrecer.
Vamos continuar,
A dar bom dia a cavalo,
A dar boa noite à TV.
                                                  Abril 2014