quarta-feira, 24 de julho de 2013

Quarto com Monstros S.A.

Lembras de teu quarto?
Quarto de moradia de monstros,
Lugar de guardar fantasmas,
E dragões embaixo das camas.
O pai e a mãe não matavam nada,
Mas eram heróis pra tudo.

Quarto com cheiro de chulé.
Cheiro de cueca,
Cheiro de calcinha,
Sempre sujas e nunca limpas.
Eram indumentárias vivas,
Sempre estavam escondidas,
Debaixo do colchão,
Ou atrás das cortinas.
Só mãe encontrava.

Quarto com teias de aranha,
E pó tipo século doze.
Que quarto!
Ora melhorava meu astral,
Ora me deixava mal.

Quarto pra guardar lágrimas,
E encharcar travesseiros.
Se guardar o dia inteiro,
E ficar madrugada adentro,
Lá dentro,
E buscar coragem,
Pra encarar o mundo lá fora.

Quarto pra dividir com irmão e irmã.
Quarto pra dividir com pai e mãe.
Quarto pra dividir pra ficar unido.
Quarto que é sala, cozinha e banheiro;
Quarto que é tudo ao mesmo tempo,
Mas ao mesmo tempo não parece com nada.
Quarto com mesa e fogão.
Cozinha com cheiro de quarto.
Gente, cama e colchão,
Sofá e televisão,
Espalhados, esparramados,
E espatifados pelo chão.

Pai e mãe cheios de rebentos,
Sempre esperando um novo pequeno,
A ser mais um a chorar junto.

Quarto com pano na janela,
Janela com 1/4 de pano.
Pôster de banda na parede,
É quarto adolescente.
Prego segurando,
Retrato amarelado na parede,
É quarto retrospectante.
Quarto de parede com bala perdida,
E culpado não achado,...
Que cidade bandida!

Quarto na escuridão da solidão,
É pra reclusão,
É pra oração,
É pra pedir perdão.
Quarto de criança ou ancião,
É lugar de meditação,
É lugar de renovação.

A gente cresce,
Às vezes a gente amadurece.
Nossos monstros,
Nossas crias desde pequeno,
Saem do quarto,
E passam a vida,
Andando conosco pela nossa vida.
A rotina é matar as crias.
A média é um dragão,
Ou um leão por dia.
                                           Julho 2013




Boo and her friend... not really a monster!

sábado, 20 de julho de 2013

Correntes da liberdade

Temos toda a liberdade,
Até chegar dezembro.
Mês doze é dose.
É mês que sentencia uma multidão,
E ficamos acorrentados ao cartão.
O comerciante, então,
É nosso carcereiro no pavilhão.

Temos toda a liberdade,
Até chegar o fim do mês.
Aí nos vendemos ao holerite.
A gente vai se virando,
Até que o mês vira,
E se demorar muito,
Abóbora é o que a gente vira.

Temos toda a liberdade,
Até olharmos para o relógio.
São inúmeros números numerosos,
Que são os senhores poderosos.
Temos hora marcada,
E tudo tá agendado.
Sempre estamos atrasados!
Relógio é que nos controla,
É ele que nos dá corda,
Parece algema no braço,
Se agarra e não larga...
E somos apontados pelos ponteiros.
Ele faz TIC TAC!
Que tic tic nervoso...
Quase me dá um ataque!
Até meu relógio interno,
Manda e desmanda. Que inferno!

Fora tudo isso,
Estamos livres e libertos.
Fora isso tudo,
Nada nos prende e somos livres.
E podemos aproveitar,
Da liberdade condicionada.
A pior liberdade,
É aquela em pele de correntes...
Correntes até os dentes!
Sorria, seu pseudo-libertado,
Você está sendo aprisionado!
                                  Julho 2013

 


terça-feira, 16 de julho de 2013

Cágado 4ever

Eu não preciso e dispenso,
Régua de engenheiro,
Fita métrica de costureiro,
Ou problemômetro,
Pra medir e mensurar,
Tamanho e altura,
Peso e grossura,
Idade e densidade,
Dos meus problemas,
Pepinos, abacaxis e afins.
Os que me chegam,
São robustos e sarados,
Malhados e pesados...
Aliás, pesados e aprovados!
É tudo problema meu!

Parece que os dos outros,
São dos tipos pintinho,
No máximo um garnisé.
Os meus são galos de briga,
Todos prontos pra rinha.
Eles me chegam equipados,
Com espora modelo pé de cabra.
E não adianta choramingar,
Dentro do quarto escuro, 
Pelos cantos do mundo,
Ou pelos banheiros imundos!
Vai ser só pena voando!
E o poleiro sempre embarreado!

Nem precisa procurar,
O problema vem a galope,
Igual cavalo trotando,
Com poeira levantando.
Igual boi castrado,
Babando atrás da vaca.
Vem quebrando cerca,
E derrubando porteira.

Aliás a gente já nasce com problema:
Chega pelado e com frio,
Passando fome e sede,
E tomando tapa feito inocente.
Tudo isso é apoiado,
Incentivado e pago,
Por dois cumpliciados,
Que deveriam ser nosso amparo.
O rebento é um coitado!
O humilhado é registrado,
Em vídeo e retrato!

Mas, se procurar,
O problema chega igual cunhado,
Numa tarde de domingo ensolarado,
Tomando a sua cerveja,
Vendo futebol com pé na mesa,
E urinando com a porta aberta.
Chegou chegando,
E se sente o dono da casa!
É pior do que MST,
Em dia de posse com TV.

Aviso aos desavisados:
Procurar problema,
É igual escolher tartaruga casca dura,
Como bicho de estimação;
Vem geração, vai geração,
E o quelônio tá ali,
Devagar e sempre presente.
Êita cágado 4ever!
                                            Junho 2013



segunda-feira, 15 de julho de 2013

Casinha de vidro

Ele sempre me olha,
Com aquela cara,
De hoje e outrora.
Parece que ele sabe coisas,
Que eu não devo saber,
E que nem vou saber.
Não deve ser da minha conta,
E faço de conta,
Que não é da minha conta.
Então não consigo fitar seus olhos...
Fico incomodado,
E vou saindo de lado.

À meia luz ele fica sinistro.
No escuro,
Eu sinto que ele ainda está ali,
Bem ali... 
Aquele lugar,
Parece outro mundo,
A me observar.

Depois de nossos banhos,
Nossos olhos,
Ficam embaçados e estranhos.

Toda manhã ele tá descabelado,
E bem mal humorado.
Assim perdura seu humor;
Ele ajeita o cabelo,
E pensa que melhorou.
Eu não digo nada,
Ele nada fala,
E ele se cala.

Ontem sua cara,
Era de poucos amigos...
Mas como ser amigo e camarada,
Se ele nada fala e só me encara?

Às vezes tá na cara,
Que o choro lhe escorreu pelos olhos.
Aí eu apago a luz,
E o deixo de lado,
Preocupado,
Em não deixá-lo encabulado.

Às vezes sua expressão,
Me deixa a impressão,
Que ele quer dizer algo,
Ou pedir opinião.
Então vou embora,
E deixo ele pra lá.
Amanhã eu volto,
Lá ou por aqui,
Ou outro lugar,
E sei que ele estará lá...
Assim espero.

Não suporto mais,
Esta prisão ilusória.
Sem vida própria,
Só reflito faces,
E ouço caras e bocas.
Que vontade que eu tenho,
De me quebrar em cacos,
Dentro deste espelho.
                                     Julho 2013



segunda-feira, 8 de julho de 2013

Passa lá em casa

Passa lá em casa,
Pra tomar uma cachaça.
Não precisa levar nada,
Mas leve a conversa fiada.

Se estiver meio assim,
Pode ir mesmo assim.
Se você estiver,
Mais pra lá do que pra cá,
Passa lá.

Se você estiver bem animado,
Você é meu convidado.

Ih, mas se estiver quase se enforcando,
Antes de fechar o nó,
Passa lá,
E vamos tomar a última sem dó.

Você é camarada, mas se você estiver,
No corredor da morte,
(Meu, que falta de sorte!),
Antes de tomar o tal choque,
Pra animar vamos ouvir um rock,
E passa lá,
Pra tomar uma antes que você chore.
 Só não digo, 
 Que vou nessa com você abraçado,
 Porque tenho que ir ao mercado.

Se você estiver na fossa,
Vamos ouvir uma bossa,
Tomando uma caipiroska.

Mas se você estiver,
Com a visita da sogra,
(Olha, rimou com bossa!),
Passa lá, mas vai logo embora;
 Não quero peso em minhas costas!
Você é importante,
Eu me importo com você,
Mas não importa como você esteja,
Passa lá,
E não deixe de ir lá.
                                            Julho 2013




segunda-feira, 1 de julho de 2013

Quando a chuva cair

Que a chuva caia lá fora.
Que o asfalto reflita as estrelas.
Que os relâmpagos nos deixem com medo.
Que o sol limpe o suor e descanse mais cedo.
Que a preguiça nos enrole no edredom.
Que o café esquente mais pra ficar bom.
Que a grama fique verde de alegria.
Que as garrafas pet fiquem à deriva,
E procurem seus donos em suas moradias.
Que os prefeitos percam o sono.
Que os bueiros bebam mais um pouco.

Que os varais fiquem pesados.
Que as donas de casa fiquem mais leves.
Que os estudantes cabulem a aula,
E fiquem encabulados pela falta.
Que os trabalhadores mostrem sua grandeza,
E os políticos fiquem envergonhados.
Que tenha guarda-chuvas de sobra pra quem merecer.
Que os sapatos não estejam furados,
E não deixem a meia aparecer.
Que as mulheres cubram suas chapinhas,
E descubram que foi caro.
Que o churrasco do vizinho se encharque.
Que os eletricistas não entrem em choque.
Que os mendigos sejam acolhidos,
E as marquises lhes sejam generosas.

Que São Paulo não cruze os braços,
Olhando o Tietê e seu povo encharcados.
Que o Maracanã e as arenas não escoam pelo ralo,
Junto com meus bilhões empreitados.
Que os castelos de areia se desmanchem,
E novos sejam erguidos.
Que a sopa seja requentada no fogão,
E tenha o suficiente no caldeirão.
Que os barrancos e barracos,
Sejam fortes iguais seus moradores,
Já cansados mas lutadores.
Que as goteiras faladeiras calem a boca.

Que gotas de chuva,
Se misturem às lágrimas de alguém,
E no final que a alegria seja plena igual ontem.
Que a janela fique embaçada,
E uma criança desenhe,
Corações e flores na sacada.
Que o vinho seja aberto,
Que o pub não esteja fechado,
E a lareira fique acesa.
Que o governador fique em pânico,
E passe a noite torcendo pano.

Que o carnavalesco e o sertanejo,
Fiquem quietos o temporal inteiro,
E um cover cante ‘november rain’,
Porque eu quero perguntar:
‘Hey man, who will stop the rain?’
Que o Lobão e a Marina,
Continuem cantando por anos a fio,
Que chove lá fora e aqui tá tanto frio...

Que neste dia a noite esteja lá no alto,
E eu esteja aqui embaixo,
Cantando e dançando na chuva.
Que a água seja benção,
E quem merecer seja abençoado.
E que assim seja,
Quando a água se precipitar do céu,
Amém.
                                                    Julho 2013