sexta-feira, 8 de maio de 2009

A gente

A gente vem do subúrbio e periferia,
Terreno baldio, terrão e campinho.
Lugar esquecido pelos ‘gravatas’,
Esgoto é conhecido como riozinho.

Nossa casa já é outra história,
O frio passa pelas janelas mesmo trancadas.
O sol não chega e paredes são emboloradas,
Buracos das portas convidam ratos e baratas.

Paredes das casas não têm reboco,
Água e luz têm nome de animal pacato.
Essa é a vida dessa gente,
No quintal tem galinha, cachorro e gato.

Seu Zé abriu um boteco,
Limparam o terreno para jogar bola.
Seu João abriu uma quitanda,
Tudo se abre menos a escola.

Febre, stress e depressão?
A gente não tem o direito de ficar doente.
Nossos idosos, nossas crianças e deficientes,
Não podem nem ter dor de dente.

Se a gente fica doente,
Tem SUS, PS, AMA.
Consulta só para daqui três meses,
Marcar exame é um drama.

O médico pergunta: Você bebe?
A gente diz: Não bebo nem como, não!
Agora já passa das quatro,
Até agora só comi um pão.

Tentam chamar a gente com letras.
Dizem que são classes e devem ser definidas.
Só sei que a nossa começa depois da terceira,
Dizem que somos letras e esquecem que somos vidas.

Os ‘gravatas’ aparecem de quatro em quatro,
Bebem água da torneira e beijam as crianças.
Falam que vem água, esgoto e escola,
Os vemos ir embora cheios de esperanças.

Os ‘nóias’ estão por ali e são parte do bairro,
A gente os cumprimenta até com gírias.
São jovens, trabalham e até pais de família,
Também precisam de ajuda e desejam melhorias.

A população aumenta e necessidades também.
Já disse, ‘gravatas’ só em épocas do ano.
Polícia é coisa rara por aqui,
Reportagem vem quando matam algum fulano.

Para trabalhar sai de noite volta de noite,
É trem, metrô e perua.
Passa o dia todo só com a marmita,
Quando volta, sua companheira é a lua.

Gente rica não faz idéia onde moramos,
Gente rica se emociona ao ver nossa situação,
Gente rica lê livro sobre nossa gente,
Gente rica conhece a gente apenas pela televisão.

Asfalto aqui é cheio de buraco,
Seria tudo diferente se fosse Moema.
Do pobre é fácil se esquecer e difícil se lembrar,
Na verdade pobre só é agradável quando vira poema.

Com tudo isso a gente é perseverante,
A gente depende da gente pra seguir em frente.
Final do dia a gente adormece contente,
Pois só Deus para ajudar a gente a ser gente.
                                                      Maio 2009

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